Também eu tinha de escrever sobre a noticia do dia, a morte cerebral de Angélico Vieira.
Quando somos jovens pensamos que somos imortais. E também somos irresponsáveis. E também cometemos erros. E também temos a mania que somos bons. E também achamos que o mundo gira à volta das nossas necessidades ou vontades.
No caso de Angélico Vieira a coisa funciona assim também, inflacionada pelo facto de ser famoso e ter dinheiro. Não me cabe a mim tecer comentários sobre se ia depressa, sobre se tinha cinto, sobre o que seja...
Apenas reflicto sobre as consequencias...e sobre o meu pai.
O meu pai teve um acidente de mota em 1985, jovem irresponsável de 22 anos, armado em herói, achava que o capacete era para se usar no braço.
Esteve em coma, comemorou-se o seu aniversário (a 4 de Julho) e ele em coma...e já só se pedia um milagre...
A minha mãe encontrou na fé o seu refugio...e um dia os médicos pediram a comparência dela e dos meus avós para desligarem as máquinas...e antes de irmos para o hospital (e relembro que as acessibilidades e meios de transporte em 1985 não eram iguais ao que são hoje) a minha mãe foi rezar à capela onde se casou (e eu casei). E rezou na entrada com a porta fechada. Eu ao lado dela. E um milagre aconteceu. Ouvimos um som...uma espécie de cantico suave, uma espécie de chilrear de pássaro...não sei definir, mas ouvimos 3 vezes...um som do mais lindo que alguma vez ouvi. Um som que transmitia paz, que transmitia alegria...um som que guardo na minha memória até hoje e guardarei sempre. E não foi sugestão...eu tinha 2 anos e meio. Lembro-me disso como se tivesse sido ontem. Não tinha qualquer referencia mental de milagres, de fé...de nada. E a minha mãe também ouviu, e ninguém acreditou nela...
Ela pegou em mim, correu monte abaixo para o telefone publico e ligou para o meu avô. Tinhamos de ir rapidamente para o Hospital. Chegamos lá e com o consentimento da familia as máquinas iam ser desligadas...3 meses e tal em coma...era muito sofrimento para a familia e naquelas altura...muitos recursos utilizados para alguém que era só mais um acidentado...
E eis que o milagre acontece...o meu pai num gesto de reflexo, porque estava a ouvir tudo, mexeu o dedo do pé. Sorte uma enfermeira ter visto e insitido para manter o ventilador. E manteve-se o ventilador por mais uma semana. E nessa semana não se mexeu mais, mas corriam lágrimas. Ele estava vivo e pedia para o ajudarem a viver.
E viveu!
Pois que foi muito sofrimento, de recuperações e retrocessos, de sequelas que se mantêm, de processos degenerativos que tendem a piorar...de discriminações por ser deficiente motor...sei lá...foram e são tempos dificeis, mas ele sobreviveu àquilo que seria a morte dele.
Quanto ao milagre, não falo disso porque ninguém acredita em mim, porque dizem que foi sugestão e desespero. No caso da minha mãe até poderia ter sido, mas comigo tenho a certeza que não. Estava lá, ouvi e senti. E aos 2 anos e meio poucas lembranças e referencias existem. Foi o som mais lindo que alguma vez ouvi e jamais ouvirei. Não me incomoda que não acreditem e por isso não falo do assunto, mas fiz questão de casar lá também, contra tudo e todos, já que é uma capela abandonada e no meio de um monte.
E se depois disto tenho pena do meu Pai? Não!
A culpa foi dele, a irresponsabilidade foi dele e não me canso de o lembrar cada vez que ele se esquece...cada vez que anda a mais de 110km/h, de cada vez que não põe o cinto...
2 comentários:
Obrigada por partilhares esta tua experiência... É bom saber que milagres afinal acontecem...
Kisses
Fiquei arrepiada ao ler o que escreveste! Eu acredito em milagres, acredito que consigas lembrar-te do que se passou. Eu também me recordo de coisas que as pessoas duvidam que sejam verdade, mas depois tenho a minha mãe que me diz que as coisas aconteceram! E tal como a Candybabe, agradeço teres partilhado a tua história, que é tão íntima mas tão importante para quem acredita que milagres acontecem!
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